É comum confundirmos alguns conceitos técnicos porque possuem definições parecidas de acordo com o contexto ou área de trabalho. Mais ainda, cada metodologia ou especialista tem sua própria forma de definir ou “chamar” alguns conceitos.
Por exemplo: para muitas pessoas um pressuposto é a mesma coisa que premissa. Não está errado, nem certo…
Precisamos, então, escolher uma forma de chamar, e definir, estes conceitos. No nosso caso, utilizaremos a definição de acordo com o PMDPro – Project Management in Development Professionals.
Segundo o PMDPRo, risco é o efeito potencial da incerteza sobre os objetivos do projeto. Em outras palavras, é algo que pode acontecer e impactar o projeto, positiva ou negativamente.
O pressuposto, por sua vez, é o ponto crucial da lógica vertical de intervenção do Marco Lógico. É algo que precisamos que aconteça (ou se mantenha) para que o objetivo do projeto seja alcançado. O pressuposto não está sob a governança do projeto e não podemos fazer nada (ou quase nada) para garantir que ocorra ou se mantenha.
Por fim, um problema é uma decisão não tomada, uma situação que está acontecendo ou aconteceu, e que afetará significativamente o projeto. Um problema pode ser um risco que se materializou, um pressuposto que não se manteve, ou simplesmente algo que não havia sido previsto antes.
Vamos tentar ilustrar esses três conceitos com um “causo” e, a seguir, apresentaremos exemplos reais.
(continue lendo o post para ler o “causo” e ver os exemplos práticos).
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No caminho do trabalho | ![]() |
Em minha rotina diária, eu acordo às 6:00h, coloco o lixo para fora, faço a barba, tomo banho, como uma fruta, tomo uma xícara de café, e me dirijo para meu trabalho, onde preciso chegar até as 8:00h. Não tenho veículo próprio, trabalho longe demais para ir à pé ou de bicicleta, e não ganho o suficiente para ir de táxi. Ou seja, vou de “busão” mesmo…
Bem, colocando em “PMDês”, temos:
Atividade |
Indicador |
Fonte de verificação |
Pressuposto |
Ir para o trabalho de ônibus | Chegar diariamente ao trabalho, até as 8:00h, todos os dias | Registro de ponto de meu trabalho |
Vamos analisar pressupostos, riscos e problemas desta atividade?
Como eu preciso ir de ônibus, devo então definir como pressuposto:
- Os motoristas e cobradores trabalharão normalmente, sem entrar em greve ou fazer “operação tartaruga” (quando eles dirigem beeeeem devagar, em forma de protesto).
(observemos que o pressuposto é algo que precisa ocorrer, para garantir que a atividade ocorra sem atrasos)
Eu devo também fazer uma análise de riscos, “coisas” que podem acontecer e que podem afetar minha atividade:
Uma via pode estar obstruída por manutenção ou por uma reforma
- Podem ocorrer engarrafamentos
- Pode ocorrer um acidente no percurso do ônibus
A partir desta definição de risco, eu devo criar estratégias de resposta a estes riscos. Para estes riscos eu posso adotar a estratégia de, simplesmente, acordar um pouco mais cedo, ou de combinar com meu chefe que em casos como este eu irei pegar um táxi, e a empresa irá me reembolsar.
Podem ainda existir riscos positivos. Por exemplo, o trânsito pode estar fluindo mais rápido que o normal, e eu chegar muito cedo ao trabalho. Neste caso, minha estratégia de risco serve para aproveitar este impacto positivo. Como? Oras… eu posso levar sempre comigo um livro na mochila. Se eu chegar muito cedo, aproveito o tempo para estudar.
Por fim, mas não menos importante, problemas podem ocorrer.
- Se o problema for um risco que se materializou, basta que eu coloque em prática (ou já esteja adotando) a estratégia que desenhei quando identifiquei o risco.
- Se o problema for um pressuposto que não aconteceu, neste caso, não tenho muita governança sobre o problema. Não vai adiantar reclamar com os grevistas…
- Mas o interessante é que os pressupostos estão no Marco Lógico, e meu financiador (meu chefe) sabe que em não ocorrer ou manter-se um pressuposto, minha atividade estará comprometida.
- Claro que irei telefonar para ele para avisá-lo, da mesma forma que enviaria um comunicado para o financiador, em um caso real.
- Mas… e se o problema for algo que não consegui antever?
E se o motorista tiver um ataque cardíaco? Eu não havia previsto… ter acordado mais cedo não vai adiantar (o tempo até que chegue um novo ônibus é muito maior do que um simples engarrafamento).
Neste caso terei que lidar com algo não planejado. Provavelmente irei telefonar para meu chefe, avisar do atraso, solicitar recursos para pegar um táxi ou simplesmente chegar mais tarde.
O importante aqui é que a experiência deste problema não previsto (seja como pressuposto ou risco) deve ser registrada. Se é algo dentro da minha governança, incluirei no meu plano de gerenciamento de riscos, e criarei uma estratégia de resposta. Se é algo fora da minha governança, incluirei no Marco Lógico como novo pressuposto, e submeterei ao meu financiador… meu chefe.
Espero que a história acima tenha ilustrado de forma lúdica a diferença entre estes três conceitos. E… claro, eu corri o risco de ter complicado mais que elucidado as dúvidas do leitor. Por isso, tomei o cuidado de adotar uma estratégia de resposta a este risco…
Abaixo segue uma tabela, com pequenos exemplos de atividades e resultados, ilustrados por pressupostos, riscos e problemas (supondo que eu não os havia antevisto).
Atividade |
Pressuposto |
Risco* |
Problema* |
Realizar uma oficina de capacitação com educadores de uma ONG | O gestor da ONG irá priorizar a participação dos educadores, em detrimento de outras atividades. | Por ser um município muito interiorano, pode haver falta de energia e ficarmos sem uso de projetores multimídia.Estratégia: levar materiais ilustrativos impressos em banners, e disponibilizar flip-chart. | O consultor contratado adoeceu e faltou ao treinamento Resposta: remarcar treinamento, inserir problema como um risco, e criar estratégia para casos futuros (um cofacilitador para o treinamento). |
Construir uma nova sala para espaço de leitura para crianças de 6-14 anos | O tempo ficará estável, sem chuvas fortes, nas próximas 05 semanas, conforme previsão do tempo. | Não encontrar todo o material necessário para construção nos armazéns da comunidade.Estratégia: realizar cotação com fornecedores de materiais em mais de uma localidade. | O material necessário só foi encontrado em armazém de município longe da comunidade, aumentando o custo do material devido ao frete.Resposta: solicitar realocação de recursos entre rubricas do projeto. Prever frete nas próximas atividades semelhantes. |
Desenvolver práticas de manejo agroecológico na horta comunitária | Propriedades agrícolas vizinhas também adotarão manejo agroecológico, evitando a contaminação da horta pelos produtos trazidos pelo vento. | O terreno está saturado de agrotóxicos.Estratégia: prever ação de descontaminação e tempo no projeto para recuperação do terreno. | A previsão do tempo foi alterada para escassez de chuva nos próximos meses.Resposta: informar ao financiador e buscar parceria adicional para irrigação por caminhão pipa. |
Diminuir os casos de trabalho infantil na comunidade (através de uma campanha) | A população da comunidade terá sua consciência ampliada a partir da campanha realizada. | Os meios de comunicação locais (rádio comunitária, jornal local) não apoiarão a campanha.Estratégia: identificar meios alternativos, tais como carro de som. | A campanha não ficou pronta dentro do prazo, coincidindo seu lançamento com o período eleitoral.Resposta: adiar o início da campanha para evitar confusão com a propaganda política. |
Comprar novos equipamentos para o laboratório de informática | Os recursos da prefeitura serão disponibilizados dentro do prazo previsto. | Os computadores adquiridos não possuírem sistema operacional ou softwares básicos (Office).Estratégia: certificar-se de lançar estes detalhes como pré-requisito para participação na licitação. | Somente uma empresa se apresentou para licitação, e sem garantia dos softwares.Resposta: cancelar licitação; realizar nova licitação em dividida em 02 processos – equipamentos e softwares. |
Receber aportes mensais (recursos financeiros) do financiador americano | O câmbio R$-USD não terá oscilação acima de 0.5 pontos percentuais para cima ou para baixo. | Variações cambiais, mesmo dentro do pressuposto, podem afetar os recursos disponíveis:Estratégia: todo ganho de capital por câmbio valorizado deve ser colocado em uma conta poupança/aplicação para cobrir eventuais déficits. | Banco Central aumentou o valor do IOF para transações de capital de 6,38% para 9%.Resposta: cobrir despesas imediatas com a poupança acumulada, e solicitar renegociação com financiador. |
* para efeito didático, foram apontadas estratégias de resposta aos riscos, e aos problemas. Mas este assunto será tratado em outro artigo, de forma mais aprofundada.
Interessante a materia, mas tenho duvidas quanto ao “risco positivo”. Dos exemplos apresentados de risco todos são riscos negativos. O ultimo poderia se negativo ou positivo, mas neste caso sendo positivo não haveria risco. Entendo que pode impactar positivamente num projeto, mas gostaria de conhecer outros riscos positivos para entender melhor este ponto.
Andrew,
Obrigado pelo seu comentário. Vamos pensar em um outros riscos positivos:
(estou usando dois riscos que aconteceram comigo no passado)
1) Digamos que a variação cambial nos faça receber mais recursos do que planejamos (quando convertido para Reais). Isso é bom… mas… pode acarretar em uma baixa execução orçamentária – o que pode ser visto pelo financiador como algo ruim. Então é preciso ter um plano, como atividades que podem ser complementares, ou mesmo comunicar ao financiador a possibilidade deste risco, deixando pré acertado que esta “sobra” irá para uma poupança ou investimento, para suprir eventuais perdas cambiais em meses subsequentes.
2) Vamos supor que uma nova metodologia, em fase piloto e de testes no Brasil, seja desenhada para uma capacitação e coaching que tenha previsto 10 encontros totais de 2 horas cada. Ao longo da primeira implementação, descobrimos que era possível realizar o treinamento e coaching em apenas 8 encontros. É um risco positivo que vai além da economia dos recursos… significa também aceleração do cronograma. Foi preciso, então, aproveitar esta economia de tempo e de recursos. No caso que vivenciei, no lugar de economizar recursos, agregamos mais conteúdo à capacitação (que já havíamos preparado, como plano de mitigação do risco…)
Forte abraço!